A morte de um ente querido, além da dor da perda, inevitavelmente desencadeia o processo de inventário, momento em que se apuram os bens, direitos e dívidas do falecido para sua posterior partilha entre os herdeiros.
Dentro desse contexto, surge como possibilidade, para cada herdeiro, a renúncia da herança, ou seja, um ato formal e irrevogável que possui implicações significativas em toda a cadeia sucessória.
Compreender o funcionamento dessa renúncia, suas consequências e as alternativas existentes é crucial para tomar uma decisão consciente e alinhada aos seus interesses.
O que é a renúncia da herança?
Em termos jurídicos, a renúncia da herança configura um ato unilateral, solene e definitivo pelo qual o herdeiro manifesta sua intenção de não aceitar a herança à qual têm direito.
Essa recusa implica que o renunciante é considerado como se nunca tivesse sido herdeiro, não recebendo nenhum bem ou direito do espólio.
A natureza irrevogável da renúncia é um ponto central: uma vez formalizada, o herdeiro não pode voltar atrás em sua decisão, salvo em casos excepcionais de comprovada coação ou erro essencial.
Os efeitos da renúncia da herança se irradiam por todo o processo sucessório. A parte da herança que caberia ao renunciante é redistribuída entre os demais herdeiros, seguindo as regras estabelecidas pelo Código Civil.
É importante ressaltar que a renúncia deve ser total, ou seja, o herdeiro não pode aceitar uma parte da herança e renunciar a outra.
Como funciona a renúncia da herança no inventário?
A formalização da renúncia da herança exige o cumprimento de requisitos legais específicos. De acordo com a legislação brasileira, a renúncia deve ser expressa.
É realizada por meio de uma escritura pública ou termo judicial, ou seja, no inventário extrajudicial perante o tabelião ou lavrado nos autos do processo de inventário, perante o juiz.
O momento para renunciar à herança é crucial. O herdeiro deve manifestar sua decisão após a abertura da sucessão (com o falecimento do autor da herança) e antes de praticar qualquer ato que configure aceitação tácita da herança.
A aceitação tácita ocorre quando o herdeiro age como se fosse o proprietário dos bens, como por exemplo, administrando-os ou vendendo-os.
Quem herda quando há renúncia?
A regra geral é que, havendo renúncia da herança, os descendentes do renunciante não herdam por representação. A parte do renunciante é acrescida à dos demais herdeiros da mesma classe (irmãos, por exemplo).
Caso não haja outros herdeiros da mesma classe, a herança é devolvida aos herdeiros da classe subsequente (ascendentes, cônjuge sobrevivente, etc.), seguindo a ordem de vocação hereditária estabelecida em lei.
Contudo, se o renunciante for o único herdeiro legítimo de sua classe, ou se todos os outros da mesma classe renunciarem à herança, seus filhos poderão vir à sucessão por direito próprio e por cabeça.”
É importante distinguir a renúncia abdicativa da renúncia translativa. Na renúncia abdicativa, o herdeiro simplesmente declara que não deseja receber a herança, e ela é redistribuída conforme as regras.
Já na renúncia translativa (também conhecida como cessão de direitos hereditários disfarçada de renúncia), o herdeiro manifesta sua intenção de transferir sua parte da herança para uma pessoa específica.
Essa modalidade, na prática, é tratada como uma cessão e está sujeita a outras regras e tributação.
Renúncia x cessão de herança: entenda a diferença
Embora ambos os institutos envolvam a não aquisição da herança pelo herdeiro originário, a renúncia e a cessão de herança são atos jurídicos distintos com efeitos e requisitos diferentes.
Como já mencionado, a renúncia é um ato unilateral e abdicativo, onde o herdeiro declara que não quer a herança, sem indicar um beneficiário específico. A formalização se dá por escritura pública ou por termo judicial
Já a cessão de herança é um negócio jurídico bilateral, onde o herdeiro (cedente) transfere seus direitos hereditários sobre um bem específico ou sobre toda a sua quota parte para outra pessoa (cessionário), que pode ser outro herdeiro ou um terceiro.
A cessão de herança exige escritura pública e ocorre antes da partilha dos bens, podendo ser onerosa (mediante pagamento) ou gratuita (doação).
Também está sujeita à incidência de impostos, como o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) ou o Imposto de Renda sobre o ganho de capital, dependendo da natureza da cessão.
Cuidados ao renunciar à herança
A decisão de renunciar à herança deve ser cuidadosamente ponderada, considerando os motivos que levam a essa escolha e suas implicações patrimoniais e familiares.
Alguns motivos comuns para a renúncia incluem o desejo de beneficiar outros herdeiros (como filhos), evitar o pagamento de dívidas do falecido que ultrapassam o valor da herança, ou questões de ordem pessoal.
Lembre-se:
Para saber sobre a renúncia da herança, é fundamental buscar orientação jurídica de um advogado especializado em direito das sucessões antes de tomar essa decisão.
O profissional poderá analisar a situação específica, explicar as consequências legais da renúncia, orientar sobre a forma correta de formalização e avaliar se existem alternativas mais adequadas.
A renúncia é um ato irretratável, e suas consequências podem impactar significativamente a partilha de bens e a dinâmica familiar.